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Desistindo de sonhos

Gostei muito de dois artigos* do psicanalista e escritor Contardo Calligaris sobre o que ocorre quando desistimos de nossos sonhos. No primeiro artigo ele dedicou-se a analisar a vida de Gil Pender, personagem do filme "Meia-noite em Paris", dirigido por Wood Allen. Conta ele sobre o sonho que o personagem tem de escrever um romance, e não mais roteiros dos quais não gosta, mas com os quais ganha dinheiro. No entanto o que o leva a esse conflito é sua renúncia a fim de agradar a noiva que ama.
Tratar da desistência de sonhos, que é algo comum na vida das pessoas, rendeu ao articulista muitas cartas de leitores que em algum momento da vida também desistiram de seus sonhos. Levantaram questões para o escritor como, por exemplo, "se desistir não é apenas o efeito de um conflito?", “se desistir dos sonhos não significa viver em frustração?" ou se ele mesmo "nunca desprezou seu próprio desejo?", o que o fez escrever novo artigo.
E as considerações do autor fizeram meu pensamento me levar a uma nova forma de ver tudo isso, pois ele diz que escolhemos entre caminhos diferentes, em virtude das circunstâncias que a vida nos oferece, e que qualquer escolha implica perdas e desistências, porém deixamos de realizar sonhos escolhendo "outros [desejos] também nossos".
Penso, então: será que desistimos mesmo? Acredito que todos nós passamos por esses conflitos, simplesmente porque nem sempre é possível viver um sonho numa realidade que não nos permite escolher livremente. Vivemos em contextos que, infelizmente, nos limitam.
Deveríamos um dia ter tentado algo diferente? Talvez. Seríamos mais felizes? Nunca saberemos. Mas nesses momentos em que precisamos escolher uma direção, vemos que essa nossa escolha, muitas vezes, vem condicionada a outras situações que devemos levar em consideração. Nada é tão simples assim. Concordo com o psicanalista, quando diz que o sentimento de culpa difícil de curar acontece não naqueles que desistem de um sonho por outro, mas quando eles "desistem de desejar". Essa culpa é o resultado da sensação de ter-se traído a si mesmo.
No entanto, culpa e frustração não nos levam a nada, porque há o tempo e as oportunidades da vida a se renovarem. E nós juntos delas. Adiamos e mudamos desejos, sonhos e planos; e nem sempre isso precisa ser mesmo desistência ou renúncia. A vida, que é dinâmica, e o tempo nos proporcionam a possibilidade de negociar no seu decorrer, "reinventando-nos" sempre, como considera o próprio autor.
E eu concordo com ele. 

Rita Ribeiro
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* "É fácil desistir de nossos sonhos" e "Volta da Flip", artigos de Contardo Calligaris, psicanalista e escritor, publicados no caderno Ilustrada, do jornal Folha de São Paulo de 07 e 14/07/2011, respectivamente.

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