Lembro-me bem de que, quando mudei para Campinas, meu pai, que havia nascido aqui, passou a procurar os lugares sobre os quais ouviu meu avô falar durante toda sua vida. Meu avô gostava muito da cidade, mas mudou-se para São Paulo. Um dos lugares que meu pai mais procurou foi a casa em que morou desde que nasceu. Ele sabia que era um sobrado em frente à Maternidade de Campinas, aliás, onde ele havia nascido. Mas para encontrar o tal sobrado foi difícil, pois, pelo que diziam a ele, em frente da Maternidade nunca houve esse tipo de sobrado que meu avô descrevera.
Meu pai procurou, procurou e nada. O tempo passou até que um dia, conversando com um vizinho, cuja família é antiga aqui de Campinas, soube que onde era a antiga Maternidade, fora construída a rodoviária da cidade. Foi uma surpresa: a Maternidade que conhecíamos não era onde meu pai havia nascido. Com essa informação ele pôde, então, encontrar o sobrado em que viveu. Brincava ele que estava contente em descobrir sua casa, mas decepcionado em saber que havia nascido na rodoviária. Era engraçado!
O sobradinho ainda está lá, antigo, mas sem preservação. Uma pena. E acabei por lembrar disso tudo, porque ontem, domingo, 28-03-2010, o antigo prédio da rodoviária, já desativada, seria implodido. Isso porque a rodoviária já havia sido transferida para novo prédio mais moderno e bonito. Ontem, tudo veio abaixo em três segundos.
O curioso de tudo isso, e que me chamou bastante a atenção, foi o fato de que, mesmo esse antigo prédio já tendo ficado velho, anacrônico, pequeno para a cidade, abandonado; mesmo a nova rodoviária estando agora grande, bonita e moderna, à altura da cidade; mesmo o antigo prédio dando diversos problemas para os moradores da localidade; ainda assim, as pessoas viram com tristeza a implosão, já sentindo saudades do velho prédio, falando melancolicamente de ter sumido o prédio que durante anos fez parte da vida delas.
Foi a implosão em si que deixou essas pessoas tristes? A rodoviária, há tempos, já não é mais lá. Há tempos lutava-se para que fosse dado novo destino àquele lugar. Por que a tristeza, se agora há uma maravilhosa rodoviária na cidade?
Fiquei pensando e me perguntei por que razão as pessoas se apegam tanto às situações e às coisas, aos prédios, a uma época, a um passado. Sim, porque tudo passou e as pessoas teimam em agarrar-se ao que não há mais, como se parassem na estação e não vissem que o tempo passou e com ele, os ônibus e o movimento se foram e não voltam mais.
Seria isso medo do novo? Medo do futuro? Medo de virar a página do passado? Ou seria uma simples nostalgia por pensar que ali, naquele lugar, de diferentes formas, muitas pessoas chegaram a Campinas, fazendo da cidade o que ela é? Talvez. Que lugar curioso esse!
Quando maternidade, muito tempo antes, pessoas chegaram, ao nascer; e na rodoviária, muito tempo depois, outros tantos recomeçaram suas vida, quando, noutras circunstâncias, também chegaram à cidade pelo mesmo local. Interessante!
E pensando assim, o lugar parece mesmo ter muitos significados. E, na verdade, o prédio cuja implosão deixa tristezas agora, irônica ou paradoxalmente, foi construído sobre uma linda e antiga construção também destruída, que seria hoje patrimônio preservado - a antiga Maternidade de Campinas.
Não são só saudades, apego e nostalgia de que tratamos aqui, mas de lembranças e memória. Esses prédios continuam firmes, belos e imponentes na lembrança, na memória e na vida de muitas pessoas. Essas construções fazem parte da história delas e de suas famílias. E da minha família também, vejo isso agora. Fazem parte da história e da memória da cidade, esta que já considero minha também.
Pois é... E fico novamente pensando... E se fosse hoje, meu pai tentando descobrir onde ele havia nascido? Como seria?
É, Rita...
ResponderExcluirComo já externei antes penso ser o apego das pessoas-nós mesmos, até, porque não?-aos locais antigos-sejam eles bonitos ou feios, pouco importa-uma maneira de nosso cérebro associar experiências vividas nesses locais tal qual o cenário de uma peça de teatro, onde relacionam-se e contextualizam-se eventos múltiplos a um determinado lugar...é isso!
Parabéns pelo belíssimo texto de rara inspiração.
Beijos.