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Reinterpretando memórias


Dia desses uma pessoa me disse que quando parava para pensar em sua vida, o que lhe vinha à mente eram as lembranças tristes que viveu. Eu respondi que, na minha opinião, os eventos bons vividos pareciam ser esquecidos por ela em função de uma espécie de culpa de ser feliz, como se toda felicidade fosse errada e não pudesse ser relembrada. Ela ficou a pensar... 
Levei à casa dela uma Superinteressante que traz um artigo que trata exatamente das memórias e o nosso passado; do nosso presente e como podemos modificar a forma de vivenciar as coisas para sermos um pouco mais felizes.
Diz o artigo que nossa felicidade está ligada às nossas memórias, portanto, ligada ao nosso passado, e à forma como vivemos o presente - que logo se torna passado. 
Aliás, nosso presente dura três segundos, e pronto! Tornou-se passado. Essa é a conclusão de estudos do psicólogo francês Paul Fraisse, aceita hoje por diversos pesquisadores, como o psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel.
Segundo essas pesquisas, após três segundos, todas as informações que vivemos saem da consciência e são arquivadas nos sistemas da memória do cérebro. Isso significaria que vemos e sentimos os eventos da própria vida através da memória.
Outras experiências comprovaram que as situações de medo são as mais gravadas na memória, junto com as situações de tristeza, e só depois, os momentos de alegria. Para se chegar a essa conclusão algumas pessoas em grupos diferentes foram expostas a imagens de filmes. No entanto, para um dos grupos, os filmes possuíam imagens violentas, o que fez com que se lembrasse das cenas vistas com maiores detalhes. Os psicólogos, então, chegaram à conclusão de que guardamos na memória os momentos de maior emoção.
E se os episódios dramáticos da vida geram memórias fortes, ao contrário, numa rotina entediante do nosso cotidiano, não produzimos sentimentos intensos. "Temos a tendência de nos lembrar melhor de coisas que têm colorido emocional", explica a pesquisadora Lilian Stein, especialista em memória emocional. A tudo isso, soma-se o fato de nossas memórias serem "semipermanentes", ou seja, "suas conexões são quimicamente sujeitas a modificações" se a ela agregamos novas informações. Se assim não fosse não aprenderíamos coisas novas.
Alterações acontecem naturalmente em nossa memória, conforme vamos reinterpretando algo que nos parecia ruim, mas que, depois de novo evento, passou a ser gratificante.
Propõem, então, que se as memórias são sujeitas a modificações, poderíamos reinterpretar os momentos tristes ou de medo vivenciados no passado, para eliminarmos a carga de emoção negativa que guardamos com elas. Seria o que o  artigo chama de "reinterpretar o passado", pois "lembranças ruins são fortes, mas elas podem ganhar um novo significado com o passar do tempo".
Dessa forma poderíamos imaginar que, se mudarmos nossa forma de agir e de pensar, fazendo um esforço para valorizar os eventos bons e gratificantes que vivenciamos no nosso dia a dia, teremos memórias carregadas de emoções positivas.
Precisamos de um presente mais feliz com eventos "diferentes" para gerarmos um passado de boas lembranças. E buscar mudanças no nosso cotidiano com novos hábitos é uma forma de viver melhor momentos presentes. "Os hábitos são uma grande oportunidade, porque podemos mudá-los", explica James Pawelski, da Associação Internacional de Psicologia Positiva.
A ciência vem hoje comprovar o que sempre, por intuição ou experiência, alguns já aprenderam há tempos: a importância de se buscar o lado positivo de tudo que vivenciamos.
E, se vemos que é possível ao homem reconstruir-se e reinterpretar as memórias do que viveu para ser mais feliz, que todos encontrem os caminhos  para uma vida de mais prazer e mais satisfação.
Para isso cabe a todos renascer todos os dias e viver sem apego ao que se acreditava imutável em nossas vidas - nossa memória.

Rita Ribeiro

* Memória & Felicidade, artigo publicado na Revista Superinteressante de janeiro de 2012

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