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A fragilidade das relações

Para o programa cujo tema foi "Transformações do mundo contemporâneo", a CPFL Cultura entrevistou, em Lies, na Inglaterra, o sociólogo polonês Zigmunt Bauman. Nessa entrevista, o sociólogo e escritor aborda sinteticamente assuntos importantes como a política mundial, o meio ambiente e o mundo globalizado; expõe sobre a democracia, o saber, a educação, as relações pessoais, o mundo virtual e a busca da felicidade. 
Como achei muito interessante tive vontade de escrever sobre o ponto em que ele aborda as relações pessoais. 
Sendo tema o mundo contemporâneo, ele inicia falando da amizade, o mundo virtual e as redes sociais que facilitaram bastante a comunicação e a possibilidade de conhecermos muitas pessoas. No entanto, ele deixa bem claro que esses "amigos" que adicionamos em grande número, e num pequeno espaço de tempo, em nossos perfis não é o amigo que ele sempre considera como tal. 
Explica o sociólogo que temos hoje a facilidade de adicionar muitas pessoas e ao mesmo tempo, e se elas não nos agradam e não gostamos mais, podemos deletá-las. Simples. E adicionarmos outras depois, mantendo sempre muitos amigos. E assim por diante... 
Ele não critica as redes sociais, mas analisa o efeito desse fácil conectar-se e desconectar-se das pessoas, o que resulta em vínculos frágeis que os homens vêm criando entre si, inclusive nas relações do mundo real. 
E se pararmos para pensar bem, quando nos afinizamos com pessoas que conhecemos nas redes, queremos logo que a amizade se estenda para o real. Sentimos que essa conexão precisa ser mais perfeita, pois como o sociólogo diz, quase não há vínculo entre pessoas que se conectam e se desconectam com tanta facilidade. 
Estabelecemos uma relação verdadeira com as pessoas com as quais queremos ver, com as quais sentimos o desejo de conhecer, conviver, trocar ideias e estabelecer vínculos de afeto. 
E o relacionamento humano, por ser algo complicado, demanda bastante de nós, pois conhecemos as pessoas, e também as diferenças; perceberemos que é necessário conceder, aceitar opiniões divergentes, como em toda relação. E isso tudo traz conflitos e dificuldades que nem sempre as pessoas estão dispostas a enfrentar. 
E estes amigos do nosso cotidiano não podemos deletar de nossas vidas nem nos desconectar de um dia para o outro, pois com elas  temos vínculos mais fortes de afinidade, afeto e compromisso. 
O sociólogo tenta nos mostrar que as dificuldades encontradas nos relacionamentos, atualmente, é consequência desse mundo consumista em que adquirimos e nos desfazemos das coisas em pouco tempo. Compramos algo e logo trocamos ou jogamos fora; e essa rapidez têm nos levado a agir igualmente em nossas relações pessoais. 
Torna-se mais fácil ter amigos hoje, e amanhã não ter a obrigação de investir nesses relacionamentos, se eles se tornarem incômodos, difíceis. E, no entanto, eles podem ser bons e duradouros para nós. 
O escritor nos alerta para o fato de podermos nos tornar "pessoas solitárias numa multidão de solitários" e continua, "todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo". "Uma situação triste e confusa, que homens e mulheres não conseguem perceber." 
Relacionamentos pessoais, sejam quais forem, de amizade, familiares, profissionais ou amorosos necessitam de vínculos fortes, empenho, compromisso e companheirismo, pois nem sempre concordaremos, nem sempre teremos as mesmas atitudes. Somos seres únicos, diferentes uns dos outros. E nem por isso podemos dispensar alguém por causa da divergência, ao contrário, podemos aprender muito com o outro, sobre o outro e, principalmente, sobre nós.
De acordo com Zigmunt Bauman, "esse viver junto e separado traz uma ansiedade e uma falta de qualidade nas relações, que a quantidade não sobrepõe"
A reflexão que fica é: até que ponto estamos substituindo relações, cujos vínculos são frágeis, para evitarmos o que nos parece meio trabalhoso? Até que ponto estamos deixando de desfrutar, aprender e crescer junto de pessoas que podem agregar, trazer algo bom para o cotidiano e a vida, simplesmente por medo dos difíceis caminhos que a convivência pode nos apresentar?

Ter lido um artigo sobre esse autor, a partir do qual escrevi um outro post aqui no blog, e por, posteriormente, ter visto essa entrevista a que me refiro, acabei comprando o livro* do sociólogo em que ele aborda essa fragilidade dos nossos relacionamentos. E eu recomendo.

Rita Ribeiro
Sob Licença Creative Commons

*"Amor Líquido - Sobre a fragilidade dos relacionamentos humanos", Zigmunt Bauman, Editora Zahar

Leia também:
"A busca incessante de amor", post publicado neste blog em 04/08/2011

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